A Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) determinou que seja revista a pena imposta pelo juiz da 4ª Vara Criminal de Contagem (MG) a Davi Gonçalves de Freitas, condenado a seis anos, 10 meses e 15 dias de reclusão em regime inicial fechado pela prática do crime de roubo de uma caminhonete, de propriedade de uma loja de ração animal da cidade. A decisão ocorreu no julgamento do Habeas Corpus (HC) 101909, de relatoria do ministro Ayres Britto.
O juiz sentenciante não considerou preponderante a confissão espontânea de Davi. No HC, a Defensoria Pública da União pediu a redução da pena imposta, mediante a compensação da agravante da reincidência com a atenuante da confissão. De acordo com a alínea “d” do inciso III do artigo 65 do Código Penal, a confissão espontânea da autoria do crime perante autoridade é circunstância que sempre atenua a pena.
O julgamento discutiu se a confissão espontânea é ou não uma circunstância atenuante relacionada à personalidade do agente e, portanto, preponderante, nos termos do artigo 67 do Código Penal (CP). O artigo dispõe que “no concurso de agravantes e atenuantes, a pena deve aproximar-se do limite indicado pelas circunstâncias preponderantes, entendendo-se como tais as que resultam dos motivos determinantes do crime, da personalidade do agente e da reincidência”.
De acordo com o ministro Ayres Britto, o dispositivo acima define as chamadas circunstâncias legais (atenuantes e agravantes) preponderantes, a saber: a reincidência, os motivos determinantes do crime e aquelas relacionadas à personalidade do agente. “Vetores, esses, que, no concurso de agravantes e atenuantes, terão maior importância na fixação da chamada pena provisória”. No HC ao Supremo, a Defensoria Pública sustentou que a confissão espontânea de Davi indica lado positivo de sua personalidade, sendo, portanto, englobada pelo artigo 67 do Código Penal.
O relator salientou que ambas as Turmas do STF têm entendido que não se pode relacionar a personalidade do agente (ou toda uma crônica de vida) com a descrição, por esse mesmo agente, dos fatos delitivos que lhe são debitados. Quando integrava a Primeira Turma do STF, o ministro Ayres Britto acompanhou o entendimento de que “a confissão espontânea é ato posterior ao cometimento do crime, e não tem nenhuma relação com ele, mas tão somente com o interesse pessoal e a conveniência do réu durante o desenvolvimento do processo penal” (HC 102486), mas, segundo ele, “hoje alcanço uma diferente compreensão das coisas".
“É que não se pode perder de vista o caráter individual, rigorosamente personalístico, dos direitos subjetivos constitucionais em matéria penal. E como o indivíduo é sempre uma realidade única, todo instituto de direito penal que se aplique – pena, prisão, progressão de regime penitenciário, liberdade provisória, conversão da pena privativa de liberdade em restritiva de direitos – há de exigir o timbre da personalização”, salientou.
O ministro Ayres Britto acrescentou que “a assunção da responsabilidade pelo fato-crime, por aquele que tem a seu favor o direito a não se auto-incriminar, revela a consciência do descumprimento de uma norma social (e de suas consequências), não podendo, portanto, ser dissociada da noção de personalidade”. No HC, a Turma reconheceu o caráter preponderante da confissão espontânea e determinou ao juiz da 4ª Vara Criminal de Contagem (MG) que proceda a uma nova dosimetria da pena.